quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Consideração da noite azul


Love is a dog from hell. Indeed.
Um último cigarro para acompanhar o último gole de cerveja. E a cerveja acaba. Mas o cigarro continua, e a noite e a música. Um milhão de versos na cabeça, a maioria alheios. Mil coisas pra dizer, como? E quando? O tempo se torna a mortalha dos dias; a música, o céu do pensamento. Guerilla ontology. Parece bom, mas precisa ser desenvolvido. Principia Discordia? Uma visão da coisa, mas para dias de humor. Descobrir o que significa whimsical. Em todo caso, não parece uma palavra que eu usaria muito. Aprender a tocar oh well. Aprender os atalhos desse pc. Aprender a não ficar fleumática com memorias. Mas ah, a nostalgia. Especialmente aquela de dias que não aconteceram. Me vira do avesso. Escrever. Fazer foto-poesia. Preparar um projeto de aulas (de qualquer forma, o jazz pedagógico tem 'dado certo'). Fumar menos. Andar mais de bicicleta. Ou fumar mais e melhor. A bicicleta, mesmo assim. Aprender a dançar? Talvez o pensamento já dance o suficiente. Um inception de deja vu é possível, mas uma coincidência muito grande não é nunca só uma coincidência. Beber mais cerveja, em todo caso. Koyaanisqatsi. Dos esquizofrenéticos, Dalí me proteja. Cohen, oh Cohen. Was it love, or the idea of being in love? Or was it the hand of fate that seemed to fit  just like a glove?









De resto, escutar isso na bicicleta, o vento na cara, e não ter vontade de entrar embaixo de um caminhão. http://www.youtube.com/watch?v=pau8Zf7srlU

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

A mulher mais linda da cidade

                                                                  


 "Mas ela era do mundo em que vivem as coisas mais belas
Têm o pior destino:
 E Rosa viveu o que vivem as Rosas,
O espaço de uma manhã."
François Malherbe


Pedi bebida para ela. Depois olhei. Estava com um vestido de gola fechada. Cass jamais tinha andado com um traje desses. E logo abaixo de cada olheira, espetados, havia dois grampos com ponta de vidro. Só dava para ver as pontas, mas os grampos, virados para baixo, estavam enterrados na carne do rosto.
— Porra, ainda não desistiu de estragar sua beleza?
— Que nada, seu bobo, agora é moda.
— Pirou de vez.
— Sabe que sinto saudade — comentou.
— Tira esses grampos daí.
— Negativo. É moda.
— Estão me deixando chateado.
— Tem certeza?
— Claro que tenho, pô.
Cass tirou os grampos devagar e guardou na bolsa.
— Por que é que faz tanta questão de esculhambar o teu rosto? — perguntei. — Quando vai se conformar com a ideia de ser bonita?
— Quando as pessoas pararem de pensar que é a única coisa que eu sou. Beleza não vale nada e depois não dura. Você nem sabe a sorte que tem de ser feio. Assim, quando alguém simpatiza contigo, já sabe que é por outra razão.


(Do velho Buk)




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Imagem: Egon Schiele

sábado, 16 de novembro de 2013

O degrau de Kafka

Sobe. A ladeira do teu delírio te espera. Pensa no degrau, naquele, lembra? De onde você veio, os degraus eram bem maiores, mais estreitos, difíceis de permanência. A vista era horrível: um palco de horrores e o chicote estalando nas tuas costas, o zuup que te arrepia até hoje. Eu sei, você fecha os olhos e vê a cara de ódio com que te olhavam, ou o escárnio no canto de um sorriso cruel quando escondiam comida de você, ou a perplexidade quando você não queria passear no meio da fedida burguesia e preferia ficar com um livro em casa, e te arrastavam pelas mãos e pelo favor que te fizeram, cuspindo 'esquisita' pra tua rebeldia. Lembra quantas tardes foram acompanhadas do Artur da Távola, o salvador do teu domingo, naquelas dissertações sublimes que acompanhavam os arcos dos violinos? 'A valsa da Morte', o frio na barriga; os russos têm mesmo algo. E a mesquinharia daqueles olhos flácidos, daquelas mãos avarentas, daquele cabelo pintado cuidadosamente pra esconder a idade, de todos eles, todos. Hoje, têm uns 20 quilos a mais; vão explodir de tanto comer. Ah, os hábitos principescos que têm grotesco até na rima.
É uma nuvem, agora, de cicatrizes e nada. Quando assistisse Aos Treze e quisesse se matar, quanta ironia, quanto grito preso. Definhava, tua alma definhava mesmo, e se não se esvaiu a tua força era mesmo maior que a deles. Aí está: tinham medo da vida livre, e te proibiam de dar aos mãos pra ela e encontrar um sorriso sincero e despido de palavras hipócritas. Cruel é pouco, é. Mas te salvasse dessa.
E a tua mãe, a tua última lembrança; os vidros quebrados e as vozes; o cabelo desgrenhado e o espírito sujo. O que fizeram com tua mãe, também. As pessoas enlouquecem sozinhas, são enlouquecidas pelo próprio reflexo no espelho em neón piscando.
E a tua flor, a carne da tua carne, que está plantada em solo infértil mas tem a fragrância da persistência. É coisa mesma da tua família, persistir na lama, pensa só. Os mais inteligentes são os mais explorados, ó ironia, sobrenome do destino. As tuas três flores: uma pisada e resfolegante se recupera; uma te conhece de longe e não te acena; a última, por fim, teve um começo trágico atrás das grades. Qual tua flor decadência preferida? Elas são suficientes pra te manter de pé, ao menos.
E a raiz de onde viesse, bruta flor: um olhar árido, de águia. É o teu, também, aquele olhar que vê os percalços do caminho mas vê a beleza da terra de onde sai tudo, também. Uma boa herança, essa tua busca incansável pela beleza.
Os teus vícios e vicissitudes ficaram pelos degraus, juntando-se uns aos outros na lista mental de quem és, junto com tua perplexidade em frente ao espelho: ficarei louca?
 No teu sorriso coube dor, e cabe. Conseguisse subir a escada vacilante da tua vida até agora. Torta e pendurada, tropeçando e se arrastando pelo carpete mágico do absurdo - daí é que gostas tanto de Kafka, menina? -  e se agarrando no corrimão do fiapo da tua esperança.  Sabes que se a vida é 'cordial quando nega e escassa quando dá', há ao menos algo a ser levado, trazido, buscado e pesado com a balança do teu cérebro racional de homo sapiens dementis. 
Outro degrau, e outro e outro. Infinitos degraus, sabe. E você sobe e cai, mas não terá de começar de novo dando cabeçadas na parede ou gritos no escuro da noite ou uivos pra lua mórbida: a tua voz tá guardada num canto da tua existência, os teus cabelos escondem tua cara no vento e tuas mãos tão firmes no corrimão pouco do tempo, teus pés tão firmes mas não plantados, movimento! 

Se pudesse

Se eu pudesse deixar de correr
Caminhava se eu pudesse deixar de caminhar
Sentava-me à sombra da nogueira azul do céu
Se eu pudesse deitar-me deitava-me
Numa cova com a forma do meu corpo em
Repouso se eu pudesse deixar de cantar
Fechava os olhos e olhava o alto vazio
Onde não acontece nada a não ser
A conciliação provisória do caos
E da luz que não se cansa de nascer.








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Texto: Casimiro de Brito 
Imagem:  Lagoa entardescente, Delira

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Meu amigo eco vazio




É...

A cell block letter

You, little brother. Blood of my blood, skin of my scars and thought of my brain: you're now in the back of my head, like a constant cabinet full of stuff. That is what's left when people are gone: their magnetic ausence on the corner of our eyes.
You enjoyed my music, didn't you? It was particularly tender when you asked me to put something on, as soon as I got home from work: I was always pleased. Our future as the cooks in the house, so bright! Even cleaning along with your cynical complaints was nice. You were the only person in the family to whom I could talk freely, and that was the least we would accept from each other.
So wildly loose you were. Left to your own fate, thrown against the walls of the world. But wild freedom, mon petit, is a tricky path: if you seek it too much, you get stuck either in insanity or inside the very rules you despised. I told you, I told you....
And you're stuck. I barely know where you are, the conditions are not clear: we just know you're suffering with bad food (if you have any), mistreating and overcrowding (and if you, who enjoy space so much, have a square meter to sleep, maybe it's good).
Our father is worried. Our brother is worried.
I cry every night. Doesn't help, but I can't help it.
I just hope you're not dragged down to the sour path these men with you are in. And I hope there's some sunlight for you everyday: the sunny days have been beautiful, but not enought without you in them, and that way we could share them.








sábado, 9 de novembro de 2013

A Flor Imaginária




Lavava a louça, ouvindo Pink Floyd, e olhava para a janela, para a noite imóvel, absorvida nos ecos da mente e da memória. O dia, o silêncio (The White Silence, como quer London), e um pensamento apareceu - popped, como se diz em inglês: caiu literalmente em algum lugar do meu pensamento e imediatamente criou raiz. A flor imaginária. Um arrepio subiu pela espinha;  é o nome para algo que nunca havia sido nomeado. Uma ideia para um poema, uma história - uma vida, talvez.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

The path is closed for lack of sensibility

It doesn't  matter how beautiful a flower can be; one can't grow it in wind.




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Imagem: Dead flowers, Odavis. Mais aqui: http://odavis.deviantart.com/art/Dead-Flowers-140990936
From my rotting body, flowers shall grow and I am in them and that is eternity.
Read more at http://www.brainyquote.com/quotes/quotes/e/edvardmunc104801.html#ZQGH2d0sfDTQldGB.99

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Não-pensar

Sobre os gênios, não importam. Se são eles que conformam o mundo, se há a mente vigorosa de onde saem a ideia e a prática e a constatação crucial de toda a dita verdade humana, há também a dúvida que não será solucionada. Fracionada, emendada e revirada será, aposte, mas há o que não seja justificável. A beleza, veja, não é absolutamente explicável ou motivada. A flor é, e é sendo. Dois raios no mesmo lugar, uma paisagem perfeita, um lapso de êxtase: não é tanto o porquê, mas o durante e depois - o Porquê não os justifica. O êxtase, vá lá... mas é um reflexo, e todo reflexo está simultâneo ou posterior a algo.
Certos impulsos são injustificáveis. Há todos os nossos conhecidos, de que falam Camus, Sartre e tantos; há os desconhecidos, os arraigados.... Entre eles, a necessidade de adaptar tudo a si mesmo e o logro de conduzir o pensamento alheio e dissecá-lo são sintomáticos. Se se toma a forma da dúvida, modela-se a paranóia da dissecação ao contrário: cada pequeno fragmento do objeto de estudo gruda-se ao pesquisador modelando-o numa esfera pensante, pesada e escura, incerta. Disforme. É preciso tomar cuidado com a mente. Se é bom que ela não tenha limites práticos e filosóficos, é preciso não perder-se no caminho. 

Gênio é apenas uma denominação com um significado abrangente, uma espécie de palavra coringa para um tipo de indivíduo enigmaticamente atento a tudo. Não é difícil chegar aí, árduo é manter-se na corda bamba do abismo da sanidade.




Para moi, a sanidade é relativa. Sentir foi sempre mais desejável que pensar.